Letícia Kawano-Dourado
Associação entre o consumo de alimentos ultraprocessados e morte
Resultados da coorte prospectiva francesa NutriNet-Santé

Pesquisa científica detectou a associação entre consumo de alimentos ultraprocessados e aumento do risco de morte [Schnabel L et al, JAMA, 2019].
Alimentos ultraprocessados são alimentos que foram “assados, fritos, hidrogenados, hidrolizados. Geralmente recebem vários aditivos como preservativos, adoçantes, corantes, sabores artificiais.”[classificação NOVA]. Nesse estudo o modelo de Cox gerou uma equação associando cada 14% de aumento no consumo de alimentos ultraprocessados houve um aumento de 10% no risco de morte.
De novo às voltas com a máxima em pesquisa científica de que “ASSOCIAÇÃO não necessariamente implica em CAUSALIDADE”. E um dos principais motivos é a agregação de fatores de risco (risk factor clustering). Por exemplo, o consumo de alimentos ultraprocessados foi mais frequente em indivíduos com menor renda, menor escolaridade, maior IMC, menos atividade física e maior proporção morava sozinho(a). Todos esses potenciais confundidores foram ajustados no modelo de Cox, no entanto, exemplificam bem como em geral comportamentos de risco vêm agregados (em clusters) e fica difícil isolar o efeito de um deles em um desfecho complexo como mortalidade. Lembremos que esses foram os fatores confundidores conhecidos nessa análise mas é possível que outros fatores confundidores não conhecidos possam estar contribuindo para essa associação entre alimentos ultraprocessados e morte. Por outro lado, o que reforça a ideia de que de fato alimentos ultraprocessados possam ser mesmo um risco são estudos mostrando plausibilidade biológica da hipótese (estudos mostrando a mudança da microbiota que pode determinar aumento de risco cardiovascular e de câncer)
Resumo da ópera: há incerteza em relação a ASSOCIAÇÃO CAUSAL entre o consumo de alimentos ultraprocessados e aumento de mortalidade. E diga-se de passagem esse é o grande problema de qualquer estudo que tenta relacionar hábitos de vida (alimentares, por ex) e mortalidade.
Quer consumir de forma mais crítica a literatura em pesquisa nutricional? Leia Ioannidis, JAMA 2018: The challenge of reforming nutritional epidemiological research
Refletindo a complexidade do assunto, cito uma brincadeira que meu marido faz volta e meia no café da manhã: “Deixa eu comer minha manteiguinha agora que ela for redimida” rsrsrs

Declaração de conflito de interesse: nenhum
Projeto Respira Evidência por Leticia Kawano Dourado
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