Chamados carinhosamente de "manels" (man + panel) do inglês
Essa discussão é antiga no hemisfério norte e boa parte da comunidade científica de lá já compreendeu a questão, tomando medidas efetivas para cuidar dessa, que é mais uma expressão dos viéses subconscientes que agem contra as mulheres no exercício da Medicina acadêmica.
Vocês sabem como se dá a seleção de um painel de especialistas em um Evento Científico Médico?
Resposta óbvia: uma mistura de costura política e expertise seleciona os panelistas. Então acompanhem meu raciocínio: Se a avaliação que fazemos das mulheres no exercício da profissão é invariavelmente contaminada por expectativas culturais (vieses) relacionadas ao gênero [1], nada mais natural de homens serem tidos como mais competentes do que mulheres, mesmo que ambos tenham o mesmo nível técnico [2]. Lembrem-se que características como autoconfiança, segurança, firmeza são vistas como características de liderança e masculinas [1]. Se mulheres a expressam, passam a ser vistas como inadequadas pois esse comportamento não é esperado para o gênero feminino, então, meninas que querem se destacar, vocês estão com problemas!
Assim sendo, entendemos que os vieses subconscientes explicam boa parte do "manels" vistos por aí. Pois homens são naturalmente avaliados como mais competentes que mulheres, mesmo tendo ambos a mesma qualificação técnica
E o rio corre para o mar, não é mesmo? Quer dizer: mais visibilidade para os homens (que participam desses painéis), e menos para as mulheres, então mais facilmente concluímos sobre a competência deles e a menor competência delas e assim vamos...
E o problema não são só os painéis compostos apenas por homens ("manels") mas os painéis "mulher-token" são igualmente ruins. O que são eles? São aqueles painéis em que uma mulher é "plantada" lá para disfarçar o tom "manel" do painel debatedor. [3] É um "tampar o sol com a peneira", não uma proposta de solução verdadeira. Os que advogam pela causa #MulheresNaMedicina #MulheresNaCiencia, querem uma solução verdadeira, não um disfarce. Há mulheres profissionais competentes tanto quanto homens que merecem oportunidade de destaque (crescimento profissional) de maneira igualitária tendo como efeito colateral a geração de modelos para as mais jovens que vem depois.
Mas a sociedade vem mais atenta, vem mudando, graças ao progresso civilizatório, afinal, a crítica ao "manel" não é para tirar o lugar de gente competente e colocar gente incompetente, mas é para chamar a atenção de uma injustiça cometida na maioria das vezes de forma inconsciente. Buscar uma sociedade mais justa é um bem maior para todos: lembremos que a "hora da caça e do caçador" se alterna e esse é o principal motivo para que todos tenhamos como objetivo a tal sociedade justa.
By the way, achei demais ano passado no ICLAF (International Colloquium in Lung and Airway Fibrosis) que ocorreu na Califórnia sobre a organização da Universidade de São Francisco: os organizadores montaram painéis debatedores absolutamente equilibrados e fizeram questão de frisar que essa foi uma preocupação da comissão organizadora (tem como não admira-los?)
Iniciativas para trazer consciência para a questão:
Uma das iniciativas que traz humor ao assunto e ganhou muita notoriedade é o blog: "Parabéns você tem um manel!" (Congrats, you have an all male panel!) [4] onde qualquer um pode postar fotos de eventos com painéis de debatedores compostos apenas por homens com o selinho chamado "Hoffsome" (do ator de SOS Malibu dando um joinha)! Tem cada um mais engraçado que o outro, postando alguns aqui para vocÊs verem mais vale a pena entrar no site deles: muito engraçado! [4]
Outra iniciativa forte é o "The pledge" onde homens assinam um documento declarando publicamente que não participarão de paineis compostos apenas por homens [5]
Para além dessas, muitas Sociedades Médicas vem se posicionando, criando comissões, procurando se sintonizar com um senso de justiça entre gêneros. Prognóstico é positivo, juntem-se a nós!
1 Eagly A, Karau SJ. Role Congruity Theory of Prejudice Toward Female Leaders. Psychological Review, 2002: 573 - 598.
2 Yiafang M, Oliveira DFM, Woodruff T et al. Women who win prizes gets less money and prestige. Nature, 2019.
Declaração de conflitos de interesse: tenho uma filha pequena, esse projeto é dedicado a ela
As opiniões aqui veiculadas representam minha posição pessoal.
Projeto Respira Evidência por Leticia Kawano Dourado
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