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  • Writer's pictureLetícia Kawano-Dourado

Maternidade e trabalho

Como equacionar?


Tenho pensado nesse Blog também como espaço de conexão entre nós Mulheres na Medicina, Mulheres na Ciência, nós mulheres que trabalhamos. Então, com essa ideia de conexão em mente, nesse post eu vou dividir com vocês como foi que eu equacionei maternidade e trabalho (e as dificuldades), e caso se sintam a vontade, ficaria feliz de ouvir em comentários ou mesmo em mensagens privadas como foi a experiência de vocês.



Mais do que bolar uma solução para aspectos práticos do cuidado com o bebê, eu percebi que eu precisava primeiro intuir o que eu queria profundamente. Passar mais tempo com o bebê? Voltar a trabalhar? Voltar a trabalhar mas voltar com calma? Não voltar a trabalhar? No meu caso, após meu primeiro filho (que é quando as grandes transformações ocorrem) eu queria voltar a trabalhar mas ir voltando com calma, havia definido o que queria, isso com uns 3 meses após tê-lo.

Uma vez definido o meu desejo, fui vendo se era possível encaixa-lo da melhor forma na realidade - não necessariamente vamos conseguir atendê-lo mas saber cada um do seu "Norte" já é um bom começo, não?


Para voltar a trabalhar devagar, precisava então pensar num esquema de ajuda doméstica, já que com 3 meses o bebê ainda mama a intervalos consideravelmente curtos, então precisava mesmo ser um retorno gradual ou home-office.


No retorno ao trabalho, não há muito segredo, a equação é bem simples e sem mágica. Nela entram 2 fatores: primeiro quão tranquilo é o bebê (no sentido de que já dorme bem, mama bem, não tem refluxo etc) e segundo: como cada um organiza ajuda seja ela o(a) companheira(o), familiares, creche e/ou babá.

Então com 3 meses, com meu bebê mamando a cada 4 horas (quer dizer me sobrava ~3 horas entre uma mamada e outra) eu fui retornando no esquema home-office + alguns dias de participação em reuniões breves.

Daí, o que parece que nunca vai acontecer (para uma mãe de primeira viagem), acontece :-) e o bebê passa progressivamente a ficar mais independente, espaçando mamadas e dando mais liberdade para a mãe. Então com 6 meses, com a introdução das papinhas, já conseguia me ausentar por períodos maiores, o que foi muito bom.


Bom, mas a vida com um bebê não se resolve com 6 meses rsrsrsrs e apesar da maior independência, ainda equacionar outros interesses e necessidades com as necessidades do bebê é bem complexo, principalmente se há a obrigatoriedade de voltar a trabalhar full time.


Como diz Donald Winnicott: mãe e bebê estarão sempre num equilíbrio dinâmico buscando um ponto equidistante entre as necessidades da mãe e as necessidades do bebê

Errata: A frase não é de Winnicott mas de Elizabeth Badinter. Ambos estudiosos do desenvolvimento do bebê


Cada binômio mãe e filho encontra sua solução, afinal são combinações muito particulares dependentes de vários fatores e cada um sabe onde o sapato aperta. Então conselhos funcionam muito pouco aqui nessa situação. Importante nessa busca pelo "ponto equidistante entre as necessidades da mãe e do filho", eu diria são:

1.Os bebês se adaptam muito bem a mudanças. Seja qual for a solução que você encontrar, o bebê em geral se adapta bem e a maior parte da preocupação antecipatória é vã. Lembre-se que todos os binômios mãe-filho conseguem, então você também vai conseguir! #acredite

2. Não fique se comparando! Por conta da insegurança de estar ou não fazendo a coisa certa, é muito comum nessa fase ficar comparando a sua decisão com a de outras mães... evite, porque daí ou você se sente péssima ou superior e ambos são estados mentais de desconexão afetiva, não de conexão. Cada binômio mãe e filho é único então não se compare! Sugiro entrar nas relações com outras mães não para se comparar mas para se conectar.

3. Encontre a sua turma: ninguém melhor do que outra mãe para entender e acolher uma mãe aflita! A minha irmã teve um papel fundamental aqui para mim. Ela já tinha tido meus sobrinhos e tinha experiência e amor de sobra para me acolher. Nos meus piores momentos de cansaço, apreensão e blues, foi em outra mãe, na minha irmã, que mais encontrei troca e consolo.

4. Peça ajuda ANTES de chegar no limite. Dormir minimamente é FUNDAMENTAL. Não há problema nenhum com seu bebê se ele dorme menos que o bebê da sua amiga (lembre de não se comparar?): o amadurecimento da área cerebral responsável pela regulação do sono e vigília varia de indivíduo para indivíduo assim como varia o timing de andar, de falar. Sei que existem várias livros, videos, workshops, rezas brabas para ensinar os bebês a dormirem que nem anjinhos hahahaha. Desculpem gente, não funciona. Se você me disser que conhece um caso que funcionou, apliquemos nossos conhecimentos de método científico e você verá que é puro efeito randômico (ou seja do acaso, nesse caso chamemos o acaso de sorte!).

Vamos lá com um pouco de método científico, afinal aqui é o #RespiraEvidência rsrsrsr para satisfazer a definição de causalidade. O ideal seria conhecer a realidade contrafactual, [1] quer dizer, num universo paralelo se não se tivesse sido aplicada a técnica de treinamento de bebês, seu bebê teria dormido bem? Só através da realidade contrafactual é que conseguimos apreender se a técnica foi a causa do bom sono. Como não temos acesso à realidade contrafactual, podemos então lançar mão de outros meios: o meio padrão-ouro é o experimento randomizado controlado onde bebês são submetidos à técnica vs "manejo padrão" e vemos o percentual de sucesso (noites bem dormidas), outro experimento possível mas com maior grau de incerteza é: interrogue vários casais que tem mais de um filho que aplicaram essas técnicas em todos os filhos: vocês vão ver que tem bebê que dorme bem e tem bebê que não dorme bem e ponto. Desculpe se frustrei alguém aqui, de todo modo, caso queiram ainda podem tentar as técnicas Super Nanny & cia - depois me contem caso vocês tenham também investigado causalidade qual foi a observação de vocês rsrsrsrs.

Por último:

5. Você não perde nada como profissional ao ter filhos, pelo contrário, a maternidade pode ser uma experiência que na verdade te torna uma profissional melhor (uma pessoa melhor já sabíamos certo? mas uma profissional melhor foi surpresa pra mim) porque os filhos nos enchem de energia, de querer empreender para mudar o mundo para melhor (com os avanços da ciência no meu caso rs).


[1] Judea Pearl and Dana Mackenzie. The Book of Why: The new science of cause and effect.


Declaração de conflitos de interesse: nenhum


As opiniões aqui veiculadas representam minha posição pessoal.


Projeto Respira Evidência por Leticia Kawano Dourado




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